quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

NÃO SOFRA COM A VERDADE, AMPLIE SEU DOCUMENTO

Arte de Marina Stivi

São técnicas 100% naturais, que não dependem de aparelhos, cirurgias e remédios. A partir de exercícios de convencimento fisioterápico com as palavras, você conseguirá fenomenal melhora na circulação sanguínea em seu p., aumento de até 10 cm no comprimento e reforço adicional na espessura. Preste atenção no método revolucionário, aplicado por mulherengos como Trotski, Serge Gainsbourg e Woody Allen, feiosos famosos e de reconhecidos dotes discretos. O trio foi usuário da estratégia, e a prova viva de que sexo é arte.

Mulher não exige que o homem tenha um p. grande, mas que tenha atitude de p. grande. Postura de p. grande. Intensidade de p. grande. Reivindica amor de p. grande.

Sexo é peso pesado. Obrigatório desvestir o roupão jurando que é pesagem do UFC.

Sexo é superlativo, ão pra cá, ão pra lá. Garanhão, gostosão.

Pode apreciar música clássica na sala, jazz na varanda, rock na cozinha, porém sexo é funk e pagode. Para funcionar, as letras são as piores possíveis, as rimas põem Chico Buarque em desespero. Metáforas apenas provocam traumas, vá que a pessoa não entenda algo e comece a chorar pensando que não gosta dela.

- Você é delicado comigo, suave, nem parece que está entrando.
(Não é um elogio da sua competência, ela acabou de avisar que não sente nada, entendeu?)

Espera-se frases óbvias, pedidos de clemência ou incitação à selvageria, para desfrutar da impressão verbal que maneja um guindaste portuário.

A comunicação não admite erro.

Sexo é persuasão. Não entraremos na cama para fotografar, mas imaginar e delirar. Quando fechar os olhos, aumente seu p. Fantasia não tem pedágio.

Sexo é épico, destinado a grandes batalhas e lanças. A palavra é mais fundamental do que o corpo. A palavra é o corpo.

O essencial é que um dois do relacionamento não acredite que o instrumento é pequeno. Que seja logo você. Não conte com a generosidade dela.

É óbvio que ela verá aquilo que você é, mas não deve se desculpar por antecedência, desista da régua de algumas sentenças como "mais vale um pequeno brincalhão do que um grande bobalhão". É assinar o atestado de óbito. Quem diz isso tem menos do que 12 cm. Quem diz isso avisa de cara do seu complexo de inferioridade. Quem diz isso não carrega uma pasta, e sim uma merendeira.

Explicar sexo somente no caso de impotência. Sexo é ação.

Não se acovarde com a zombaria. A atitude de p. grande afasta o bullying. A parceira observará seu p., escutará o que você fala, revisará o seu p., ouvirá de mais perto, ficará intrigada com sua fé, e prometerá mentalmente procurar um oculista. Achará que ela é que está errada e tratará de compensar a protuberância invisível da sua natureza com caprichos de uma gueixa.

Melhor propaganda enganosa do que calúnia e difamação.

Não subestime o poder de negação.

Se ela tirar uma imagem do seu p. da câmera do celular, argumente que faltou zoom. Se ela gravar em vídeo a transa, culpe o amadorismo da gravação.

Imbatível até hoje o combinado de forças entre o poder da negação e o poder da afirmação.

Afirme diante do espelho:

- Tenho um p. grande.

Negue diante dela:

- Não tenho um p. pequeno.

Todo mundo receia ser louco, todo mundo teme perguntar demais e ser inconveniente. Sua insistência abalará qualquer certeza.

Seja orgulhoso.

Recorde de Davi, do Michelangelo. Aquele nu frontal é constrangedor. A mais famosa estátua do mundo tem um p. infantil. Mas seu semblante é de guerreiro, visionário, mirando longe, alheio a pormenores.

Com a convicção de que não é avantajado, não se entregue fácil. Minta para si e para os outros. A verdade - tanto quanto a mentira - estraga o suspense.

Não há documento que não possa ser ampliado pela estima.

A confiança é que torna o macho superdotado. Jamais se envergonhar, não menosprezar os centímetros de sua volúpia.

Pare de se lamentar e fugir da convivência. Confira ações que aumentarão sua escultura. Aposte na incoerência. Aja exatamente ao contrário do que costuma agir.

a) Não use a casinha dos banheiros, mije no mictório e, de preferência, no meio para mostrar autoridade;

b) Brinque quando ela fala sério, fale sério quando ela brinca. O desacordo favorece a tensão e hipertrofia o interesse;

c) Ponha sunga branca para ir à praia, despreze bermudas e aquilo que serve para esconder o volume;

d) Numa festa entre amigos, seja o primeiro a ameaçar o strip. Impossível raciocinar que um exibicionista possui p. pequeno;

e) Nunca transe no escuro. Acenda todas as luzes, inclusive compre refletores. No palco, o ator não enxerga o público. Portanto, ofusque sua plateia;

f) Tire uma por uma das peças com lentidão de filme de Jean-Luc Godard. Comprovado que ninguém aguarda o homem se desvencilhar da cueca.

g) Conte histórias sexuais, crie personagens e situações excitantes durante o ato. Guie sua parceira no jogo de provocações. Aproveite para engrandecer seu corpo.

h) Faça questão de sexo oral, para não restar dúvidas do disfarce psicológico.

Publicado na Revista Vip
Edição 324 Ano 31 Março 2012
Ps. 88-89

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

AS MEIAS VERMELHAS DE MEU TIO-AVÔ

Arte de Lucien Freud

Escrevi sobre o padre Nejar e recebi inúmeras confidências dos leitores.

Agora, sim, acho que o conheço bem. Conhecemos uma biografia quando desfrutamos de informações suficientes para mentir a seu respeito.

Já poderia, portanto, mentir sobre Alberto Nejar, meu tio-avô, mas desejo expor uma verdade.

A verdade sempre me seduziu mais do que a mentira. A mentira impressiona, a verdade emociona.

Alberto Nejar era monsenhor da Igreja São Geraldo.

Passou a vida esperando ser bispo, pois estava a um passo da recompensa profissional. Tratava-se da próxima escala; natural, previsível. Assim como depois de um capitão vem a estrela de major, assim como depois de um capitão-tenente vem a cruz bordada de capitão de corveta.

Alberto aguardava assumir o ruivo do solidéu, o rubro da batina. Ansiava pelo reconhecimento do trabalho comunitário, da evangelização dos jovens pelo esporte, das campanhas de agasalho e acampamentos no Interior.

O que me entristece é que ele, tão certo da promoção, tão convicto da transição, comprou meias vermelhas de bispo jurando que seria chamado. E não foi. Nunca foi.

Ele dormia com meias vermelhas de bispo para atrair sorte, talvez para convencer o destino a entregar a carta do Vaticano no dia seguinte. E não veio. Nunca veio.

É um desconforto projetar o quanto ele sofreu em silêncio. O quanto padeceu em segredo para não ser tachado de ambicioso.

Mas alguém incutiu a esperança nele, Alberto não concluiu sozinho que seria bispo. Tudo deve ter partido de uma insinuação, de uma fofoca. Alguém influente torturou Alberto com sua própria fé. Criou uma falsa expectativa para retirar o resto pouco a pouco, para deserdá-lo do sentimento de justiça e retribuição que tinha pela vida.

O exemplo de meu tio renova meu cuidado na hora de conversar: não temos o direito de maltratar a esperança do outro.

Se não ama seu namorado ou sua namorada, deixe ir, não fique prendendo por comodidade e vaidade. Se um convite desagradou, diga de cara, não torture com desculpas. Se está interessado em promover um funcionário, faça logo, não fique adiando ou explorando a expectativa para que o sujeito trabalhe mais. Se pretende oferecer um presente,  dê rápido, sem suspense, não realize chantagem.

Há a necessidade de ser direto e evitar insinuações que provoquem mal-entendidos. Não procure o benefício da dúvida, e sim a lealdade da palavra.

Falar a verdade o quanto antes, para que a pessoa possa adaptar-se com a perda, criar um novo sonho e mudar a cor das meias.






Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 28/02/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 16993

NADANDO NAS ÁGUAS DE MARÇO


Meu filho Vicente, 10 anos, experimenta aquela expectativa do retorno escolar que já vivi na infância, o nervosismo tomado de perguntas: Permanecerá a mesma turma? Terei outros colegas? Sentarei ao lado de quem? Como serão os professores? Fáceis ou complicados? Vão gostar de mim? Haverá campeonato de futebol? Ficarei no time?

Ouça meu comentário de terça (28/2) na Rádio Gaúcha, programa Gaúcha Hoje, apresentado por Antonio Carlos Macedo e Daniel Scola:

sábado, 25 de fevereiro de 2012

O ÚLTIMO SUSPIRO É O DA MÃO


Arte de Leonardo da Vinci

Os doentes terminais ficam com o punho fechado, preocupados com a próxima pontada, controlando o retorno do soluço, antecipando o lugar dos tremores.

Não abrem a mão, fincam as unhas na palma, podem se machucar e rasurar as linhas do destino.

Estão concentrados em seu próprio sofrimento, atentos ao som como uma noite sem estrelas.

As enfermeiras criaram um truque para aliviar a dor: colocam entre os dedos dos pacientes uma luva com água morna dentro.

É um faz-de-conta. É como se um familiar segurasse a mão deles naquele momento de angústia.

Os doentes se tranquilizam, se acalmam, e o braço se solta para a janela.

Na despedida, dependemos somente de uma mão segurando a nossa. Tolos ou gênios. Toscos ou eruditos. Todos somente procuram o corrimão de uma amizade. O corrimão de um parente para descer os degraus da morte, suportar a penumbra e não cair desmemoriado nas lembranças.

O último suspiro é o da mão, não da boca. O poeta Goethe não disse 'Licht! Licht! (Luz! Mais Luz!) em sua derradeira exclamação. Foi um lamento prosaico, comum, destinado a sua neta Ottilie: "Me dá sua mão".

A mão de quem a gente ama é a nossa luva. Mas com sangue quente a encurtar os batimentos cardíacos espaçados pelo fim.

A mesma mão de sempre e tão nova.

A mão materna na hora de atravessar a rua. A mão paterna mexendo de orgulho nossos cabelos. A mão da caligrafia dos cadernos, com a cabeça inclinada na mesa. A mão brincando com o graveto na boca do cachorro. A mão boba no cinema. A mão para levantar o véu branco da esposa. A mão ansiosa a segurar o primeiro passo do filho.

A mão assustada de ternura. Ossuda, magra, com as veias azuis pedindo passagem. Envelhecida, absolutamente carente, que vai acenar de verdade apertando outra mão.

Ouça meu comentário na manhã de sábado (25/2) na Rádio Gaúcha, no programa Gaúcha Hoje:

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

ORIGEM DO MAL


Descobri, descobri, descobri porque o homem é insensível.

Sabe aqueles testes de revistas femininas? Nos deixaram de fora.

Não contamos com a sorte de preencher os questionários que aparecem na Cláudia, Capricho, Atrevida.

Nem a Placar, nem a Playboy, nenhuma publicação masculina se preocupou com os nossos medos.

Ficamos destreinados, sem preparação intelectual para enfrentar o casamento.

O homem não teve oportunidade de responder enquetes sobre o amor, o sexo, a paixão. O que nos falta é o raciocínio de múltipla escolha, que sobra nas mulheres.

O homem não pôde testar se sua namorada o amava, se transava bem, se ela queria ficar junto dele pelo resto da vida.

Nadinha de nada. Não pode se especializar no comportamento dos outros. A diversão de marcar x ao lado das letras, conferir resultado ao final.

Foi uma maldade que fizeram com a gente, um crime.

Então, tomei a iniciativa de libertar os homens. Pegue papel e caneta na mão, e vamos testar nossos conhecimentos, nunca é tarde para saber quem somos:

1) Caso sua mulher aparecer em casa com as pantufas da Minnie, você a recebe com:

a) Manda ela devolver na loja e trocar por uma caneca do campeonato gaúcho;
b) Escondido, pega um estilete e corta as extremidades da pantufa para facilitar seu fim;
c) "Que fofo, eu vou comprar a do Mickey para formarmos um casalzinho".

2) Quando você chega tarde do futebol, sua mulher pergunta onde esteve, qual é sua reação?

a) "Não fiz gol, não me incomoda!";
b) "Pára de me controlar, estava explicando aos amigos porque joguei mal";
c) Senta para conversar e enfrentar uma Discussão de Relacionamento de duas horas.

3) No momento em que você abre a porta, é surpreendido com a casa no escuro, tomada de velas:

a) Nem estranha, acredita que faltou luz;
b) Usa a lanterna do celular;
c) Lembra que esqueceu o aniversário de casamento e sai de fininho para comprar um presente.

4) Quando ela perceber que seu catálogo telefônico do celular só tem mulher, sua explicação é:

a) "Um dia posso precisar ligar para alguma";
b)"Tenho preguiça para apagar telefones";
c) "São amigos que trocaram de sexo".

5) Quando você goza rápido, qual a sua reação:

a) Já está roncando;
b) "É que você me deixa muito excitado";
c) Foi mal!

Quem assinalou a letra A no mínimo três vezes, parabéns, você é um grosseiro de marca maior.
Quem assinalou a letra B no mínimo três vezes, parabéns, você é um mentiroso.
Quem assinalou a letra C no mínimo três vezes, parabéns, você é um animal doméstico.

Ouça todo meu comentário de sexta (24/2) , na Rádio Gaúcha, no programa Gaúcha Hoje, apresentado por Daniel Scola e Jocimar Farina:

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

PREGO

Arte de Odilon

Mudei de apartamento. Após meses abrindo caixas e sorteando relíquias, o imóvel estava pronto, limpo, encerado.

Meu mundo tinha novamente gavetas vazias para serem preenchidas. As estantes não pecavam pela superpopulação carcerária. Acabaram-se as filas duplas, o amontoado da pressa, o engarrafamento do escuro.

Não dependia dos subterrâneos dos sofás e camas para guardar a bagunça. Poderia encontrar o passado em minutos.

Reinava uma paisagem despojada, zen, iluminada. A residência fez uma cirurgia de estômago e tirou um edifício de dentro.

Mas senti falta de algo que não entendia bem o que era. Até que recebi dois quadros de um amigo.

- Os quadros? Onde estão meus quadros? Como fui me esquecer?

Não contive a saliva, babava empunhando a foice e o martelo: os quadros! Faria uma revolução comunista nos corredores. Acelerado como um poço petrolífero.

Arrumei uma escada com o vizinho e fui marcando os pontos de perfuração com um lápis. E apagando. E apagando.

As aquarelas e pinturas não combinavam com a decoração. O mesmo que enfiar um MASP numa pousada. Nenhuma 0moldura tinha lógica. Optei por forrar a casa de prateleiras e as raras frestas não deveriam ser ocupadas, voltaria ao crime da sobreposição, renegaria os pagamentos da arquiteta e da decoradora, desprezaria o minucioso aproveitamento da luz.

Por que diabos me tornei profissional do lar?

Meu caos intelectual não tinha amparo na ordem da aparência.

Vivi uma grave crise de identidade. Para me acalmar, coloquei uma bala soft de abacaxi debaixo da língua, rivotril de minha infância. Não me tranquilizei. Parti ao Plano B. Convidei a mulher e os filhos para almoçar no restaurante Copacabana. Uma macarronada ao sugo me salvaria.

Descartei o avental, o guardanapo, o escudo da guerra. A selvageria sempre me educou. Pretendia me sujar a sério, manchar a gola, espirrar molho vermelho na camisa imaculada e engomada do Gênoa.

A sujeira no almoço é uma libertação. Ao final, já estaria rindo e comendo na própria panela.

Não veio recompensa. Ao espiar os lados, lacrimejei de inveja, aquele miado de homem que desaprendeu a chorar.

As paredes do restaurante italiano estavam todas cheias de retratos, bandeiras de times, fotos de clientes, santos, dedicatórias de artistas. Uma opulência palaciana. Não existia sequer espaço para cupins.

Todo restaurante italiano é assim: uma Capela Sistina da família, um brechó de vivências.

E os quadros iam até o teto, não se restringindo a altura média dos observadores.

No centro do salão, eu media o tamanho de minha carência.

Sou igual, desejo logo viver para esnobar lembranças. Gringo só gosta de presente que pode exibir aos parentes.

Gringo não se importa com a simetria, procura o escândalo, a vastidão do grito.

Não há meio-termo. Amor sem ciúme não serve. Amizade sem boemia não serve. É tudo ou nada para já.

Eu sufoquei o sotaque. Aniquilei a cafonice com a elegância do mínimo.

Casa de gringo é ensaio para armazém, é rascunho de mercado de pulgas.

Gringo que é gringo não tem paredes, mas altar. Expõe sua história para agradecer, entende cada imagem pessoal como uma vela, uma oferenda, um obrigado.

Ele não conhece tinta branca; a brancura causa repulsa, é inexistência de Deus, ausência de inspiração, covardia.

Gringo é barroco, colorido, biográfico. Não descarta um mísero mimo. Ao receber um pôster da Dinamarca, prega na madeira. Ao receber um cartaz do filme Bambi, prega na madeira. Ele não escolhe, acumula. Coletiva seletiva para o gringo é traição; esquece apenas quem lhe virou as costas.

No fundo, italiano tem medo de morrer sozinho, sem nada para mostrar. Tem medo de morrer de fome emocional.

Gringo que é gringo come com os olhos.

Publicado pela Carta Fundamental
Fevereiro/2012 Nº. 35
São Paulo (SP), Ps. 30-32

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

QUAL O SEGREDO DO PADRE NEJAR?

Arte de El Greco

Meu pai teve um tio padre: Alberto Nejar.

Preencheu a cota de ascese da família. Uma batina para aliviar a língua ferina de duas gerações de escritores.

Ele conduzia as missas no bairro São Geraldo, em Porto Alegre.

Nunca tive a chance de ouvi-lo no púlpito, na verdade não lembro de qualquer encontro. Acho que meu pai brigou com seu tio, o que indica uma imensa coragem. Brigar com padre é coisa de bagual, ainda mais do mesmo sangue. É realmente não temer o inferno.

Imaginava o sacerdote com frequência, a ponto de acreditar que eu o conheci: bufo, bochechas rosadas pelo calor, gargalhada rouca, barriga de senador romano. O engano decorria de uma fantasia repetida. Toda lembrança é uma fantasia repetida.

Alberto foi um de nossos mais famosos parentes. Mais do que ele, somente um remoto Ildo Nejar, dirigente e árbitro de futebol no Rio de Janeiro.

Quando soletrava meu sobrenome na infância, logo me perguntavam qual o vínculo com o padre Nejar. Fiquei craque em responder por evasivas, comentar da distância dos laços, levantar os ombros aos pássaros.

Mas me espantava com a adoração dos fiéis:

– Padre Alberto nos motivava a voltar!
– Não existia um padre igual!
– Alma compreensiva!

Intrigado com o impacto positivo na paróquia, nunca encontrei alguém que falasse mal dele, que insinuasse casos secretos, hábitos estranhos, favorecimentos esdrúxulos, desvio de hóstias para casquinhas de sorvete, superfaturamento de vinhos de garrafão.

Perante sua trajetória ilibada, inconsútil, não duvidaria de uma possível beatificação, fardo intolerável. Um padre na família estava de bom tamanho, um santo seria um transtorno psicológico irreversível. Ninguém mais poderia cometer maldades em paz.

O curioso é que o elogio de seus contemporâneos vinha com convicção, nem fazia sentido questionar o motivo do favoritismo. Deduzia que fosse um excelente orador, que falava as verdades na cara dos pecadores e lotava as missas dominicais. Ou que resolvia impasses do confessionário com excelentes conselhos. Ou que cantava lindamente, barítono acompanhado do coro da Terceira Idade.

Mordido pela cisma, finalmente perguntei a um antigo coroinha da São Geraldo o segredo do padre Nejar.

– Por que todo mundo gostava dele?
– Sua missa era a mais rápida da cidade.





Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 21/02/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 16986

SINCERAMENTE EGOÍSTA

Arte de de Kazimir Malevich

Todo mundo odeia ser chamado de egoísta, mas todo mundo é. Por mais que busque disfarçar. O egoísmo é aquilo que a gente ama tanto que acha que o outro não merece

receber ou aquilo que a gente odeia tanto que não somos capazes de confessar.

- Egoísta é o que usa o gelo e não repõe as forminhas.

- Egoísta é o que esconde o resto do doce na gaveta das verduras.

- Egoísta é que vai dormir cedo para não fazer sexo.

- Egoísta é o que desperta cedo para trabalhar e não consegue ficar quieto: acorda junto a casa.

- Egoísta é o que perde algo e põe a família a procurar.

- Egoísta é o que pega quatro revistas ao mesmo tempo no salão e empilha no colo.

- Egoísta é o que sofre sozinho e acha que sua dor não tem igual.

- Egoísta é o que não atende o interfone e a campainha para não ter que falar com os amigos.

- Egoísta é o que corta as unhas dos pés e larga as pontas no sofá.

- Egoísta é o que compra um carro com dois lugares, para não dar carona nas festas.

- Egoísta é o que carrega uma nota de cem reais e nunca pode pagar porque não tem troco.

- Egoísta é o que não diz sua opinião para ver o outro se matar tentando agradá-lo.

- Egoísta é o que não troca o papel higiênico. Mais: abandona o rolo com apenas uma volta do papel.

- Egoísta é aquele que acha que romantismo é perda de tempo e vive reclamando do tédio na relação.

- Egoísta é o que promete mudar (deixar de fumar, deixar de beber) para fingir que tentou.

Egoísta mesmo é o que não se considera egoísta. Não reparte seu egoísmo com ninguém.

Ouça meu comentário da manhã de terça (21/2) na Rádio Gaúcha, no programa Gaúcha Hoje, apresentado por Daniel Scola e Jocimar Farina:

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

ALECSANDRO

Rolo Compressor analisa a sina do centroavante calado. Elabora a teoria de que artilheiro pede gols e palavras.

"A grande verdade do futebol é que o atacante não tem direito a ser tímido. Terminará rejeitado na primeira crise.

Porque predomina o hábito de confundir recolhimento com arrogância.

O retraído não gosta de falar, não gosta de se expor, não gosta de provocar e comentar desempenhos. E não realiza publicidade de seus atos, campanha de recordes, como um Dadá, um Túlio Maravilha.

É a única função que exige oratória, megalomania, que o sujeito seja exibido."

Leia mais na prancheta.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

FABRÍCIO CARPINEJAR ESTREIA PROGRAMA NA GAZETA

'A Máquina' terá entrevistas, e apresentador vai interagir com cenografia. Programa do autor gaúcho irá ao ar uma vez por semana, nas noites de terça-feira; estreia ocorre em março

ELISANGELA ROXO
DE SÃO PAULO
Foto de Marcelo Ferrelli/Divulgação



O escritor Fabrício Carpinejar explica: "Não sou um apresentador, sou um vírus. Um vírus dentro do computador."

Ele dá risada do próprio enigma ao explicar como será sua estreia na TV, programada para março na TV Gazeta, em "A Máquina".

Desde dezembro, o autor gaúcho tem vindo de Porto Alegre a São Paulo para se reunir com a equipe de produção e gravar os primeiros pilotos do programa.

Carpinejar fechou contrato de seis meses para comandar a atração, em que fará entrevistas e vai interagir com uma máquina cenográfica, a tal que dá nome ao programa. "Tem até uma alavanca", ele explica. E conta que a inspiração vem de "Tempos Modernos" (1936), protagonizado por Charles Chaplin.

O programa irá ao ar nas noites de terça, após o clássico cult "Todo Seu", apresentado pelo "príncipe" da jovem guarda, Ronnie Von.

"Sou fã dele, mas ainda não o encontrei para pedir umas dicas", diz Carpinejar.

Ele ainda faz segredo sobre seu primeiro convidado e conta que a estreia será gravada com um dia de antecedência. "Eu me sinto tão importante tendo segredos. Acho que a gente precisa se acolchoar em segredos e mistérios na vida."

ANTES ENTREVISTADO

O escritor explica que o convite para o projeto na TV partiu da própria emissora.

Ele acredita ter sido cotado por sua "postura forte nas redes sociais" (é uma espécie de rei dos aforismos no Twitter, onde 140 mil pessoas o seguem), mas as performances como entrevistado do "Programa do Jô" (Globo) "também fizeram diferença".

"Não tenho vergonha do fútil, não preciso parecer importante e não estou preocupado com a concorrência", ele esclarece.

"Quero é que tenha audiência", explica. Mesmo sabendo que a Gazeta não costuma registrar altos índices junto ao público, ele se acha capaz de conquistar fãs. "Todo azarão é simpático, e é sempre bom torcer para o time mais fraco."

A literatura e a internet não ficam de lado enquanto estiver na TV, garante Carpinejar. O autor trabalha atualmente no livro de poemas "Inimigo Imaginário" e no de crônicas "Ai Meu Deus, Ai Meu Jesus", ambos ainda sem previsão de lançamento. "Na hora em que os livros não me aguentarem mais, eu os publico."

NA TV
A Máquina
Estreia do programa
QUANDO às ter., a partir de 6/3, às 23h30, na TV Gazeta
CLASSIFICAÇÃO não informada

Publicado no jornal Folha de São PauloCaderno Ilustrada, Televisão
São Paulo (SP), 18/02/2012

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

COMO SE PREVENIR DE UM CAFAJESTE


É Carnaval, e são grandes as chances de encontrar um cafajeste e confundi-lo com o amor de sua vida. Prevenindo dor-de-cotovelo, proponho um retrato falado da criatura.

- O cafajeste faz propaganda enganosa para se dar bem. Tem todas as qualidades do universo, fala sem erro, ensaiado, jamais gagueja ou fica desconcertado.

- O cafajeste sempre aparece em seu mundo e nunca mostra o dele. Parece tele-entrega. Só realiza visitas. Com certeza, ele não pode mostrar onde vive, é casado e tem outra família.

- O cafajeste quer casar no primeiro encontro. Somente um cafajeste quer casar no primeiro encontro.

- O cafajeste avisa que não tem pressa para o sexo.

- O cafajeste chama você de gatinha, de guria, de menina, menos de seu nome. Ele não sabe seu nome.

- O cafajeste é aquele cara que não precisa mentir, você mente no lugar dele, antecipando desculpas ou justificando suas mancadas.

- O cafajeste escolhe as mulheres mais possessivas e ciumentas, que se apegam rápido.

- O cafajeste foge das discussões onde mostraria seus preconceitos.

- O cafajeste conhece de cor um poema de Neruda ou de Vinicius de Moraes.

- O cafajeste está apaixonado. Por si mesmo. Vive se elogiando.

- O cafajeste é um avatar, solteiro no facebook e nas páginas de relacionamento, comprometido na realidade.

- O cafajeste não se arrisca na roupa. Prefere camisa polo.

- Você pensa que o cafajeste está criando mistério ao não telefonar, mas ele simplesmente esqueceu de você. Suspense do cafajeste é abandonar a pessoa.

- O cafajeste manda rosas depois da primeira noite. Você vai entender depois que não é um buquê, e sim uma coroa de flores.

- O cafajeste é tudo o que a sua mãe sonhava para você, o que não é nada promissor.

Ouça meu comentário na manhã de sexta (17/2) na Rádio Gaúcha, no programa Gaúcha Hoje, apresentado por Daniel Scola e Jocimar Farina:

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

MOTEL DE CACHORRO


Minha mulher decidiu que nossa cadela Cora teria filhotes. Ela finge que é uma pergunta, mas é uma decisão.

– Vamos cruzá-la com algum cachorro bonito?

Qualquer sim ou não de nossa parte jamais mudará o resto da história.

– Descobri um maltês passeando pelo bairro Moinhos de Vento, bem alegre, que tal?

Ela já havia recrutado o pretendente, falado com a dona, programado o namoro quando propôs o assunto para nossa família.

Eu não chamaria minha esposa de autoritária, eu a amo, o nome disso é liderança.

Cora não foi castrada e desfrutaria da chance de conhecer o príncipe de sua vida. Ou, pelo menos, experimentar um pouco de sexo para alimentar sua memória de janela e porta.

Ela sofre muito com os acessos de excitação. Diria que é um caso de dupla personalidade, um Cisne Negro em miniatura. Fica louca no cio, girando na ponta das patas. Seu pelo incha, espetado, poroso, como se todo o corpo fosse um interruptor da rua. Baba, a língua é de Gene Simmons, e transa com a cama rosa sem parar.

Coitada da cama acolchoada: agora furada e com a esponja saindo pelas quinas.

Scott seria a nova vítima da fúria predatória.

Ele apareceu em casa para uma experiência. O veterinário explicou que o enlace deve ser na residência da cadela. Uma das regras do flerte canino.

Eu me ralei. O apê recém montado transformava-se em motel de cachorro.

Brincalhão, fofinho, Scott contava com dois anos. Cora apresentava cinco. Se cada ano vale sete, os dois juntos correspondiam a um tórrido caso de um adolescente com uma balzaquiana.

Scott não se mostrava interessado em copular, e sim em brincar de chafariz. Mijou a sala 20 vezes. Cora subiu no sofá para escapar da irrigação da lavoura. Nem se tocaram. Chegamos à conclusão de que ela era uma cadela de família, certo que não daria no primeiro encontro.

No segundo dia, Scott não mudou a tática, Cora repetiu o isolamento do sofá e o tédio. O mesmo ocorreu no terceiro, quarto, quinto dia. Nenhuma montaria, cheirada, aproximação. Faltava química, biologia, matemática, física.

Cansados, sem pano seco para lavar o piso, abortaríamos a missão. Mas a esposa apanhou Cora fornicando com a caminha e chamou correndo Scott para aproveitar a libido em plena atividade.

Preparamos acepipes e deixamos os cachorros sozinhos na sala, à vontade, por uma hora.

Depois de um tempo, escutamos barulhos fogosos, latidos, gemidos.

Festejamos o fim da virgindade de Cora e a futura ninhada.

Ao espiar pela fresta, vimos Scott trepando com a cama da Cora, mordendo as almofadas, desesperado.

E Cora dormia no alto da cadeira, de camarote, bocejando com a ópera. Nem entre os cães funciona casamento arranjado.



Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 14/02/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 16979

MULHER CATIVANTE

´
* A mulher cativante não recebe o homem com uma longa lista de problemas que ela teve naquele dia.

* A mulher cativante nunca deve rejeitar seu marido em favor dos filhos.

* A mulher cativante sempre avisa onde está e gosta de esperar o marido em casa com comida pronta.

* A mulher cativante sabe que o sexo representa um papel muito importante na vida do marido. Por isso ela sabe também que:
- não pode recusá-lo;
- tudo o que fizer na cama dirá que aprendeu com ele;

* A mulher cativante aceita que o homem se interesse por futebol e pela companhia dos amigos.

* A mulher cativante não desconfia quando o marido trabalha longas horas e chega tarde.

* A mulher cativante não pode exigir que o homem diga que a ama milhões de vezes.

* A mulher cativante tem a obrigação de passar batom e se maquiar e aparecer bonita e perfumada.

* A mulher cativante deve considerar o homem a pessoa mais importante de sua vida. Deve dar-lhe mais valor do que a todas as outras pessoas - inclusive a si mesma.

Você acredita nisso? Tem alguma coisa errada. Retirei todas as frases da revista Seleções, de outubro de 1969, há 43 anos. O nome do texto: "Que é que torna a Mulher Cativante?", do psiquiatra americano Theodore Rubin.

Quem concorda com essas afirmações não é machista, é escravagista.

Você não quer uma mulher, mas uma escrava. Trate de mudar, ou seu destino será o sebo, onde encontrei a revista, ou a delegacia.

Acompanhe meu comentário da manhã dessa terça (14/2), na Rádio Gaúcha, no programa Gaúcha Hoje, com Daniel Scola e Jocimar Farina:

domingo, 12 de fevereiro de 2012

SANTUÁRIO DO RISO E DA GASTRONOMIA

Helena Stacke (com o macaco hidráulico que não deve ser alimentado), a cunhada Janice Ledur, a irmã Marlise, e a mãe, Ila, compartilham a gerência da casa onde a alegria abre o apetite. Fotos de Emílio Pedroso

Nas árvores, uma placa adverte: “Não dê comida aos macacos”. Observando os galhos, realmente há um bando de macacos, mas macacos hidráulicos. Nos bancos, um outro aviso: “Você está sendo monitorado por câmeras”. É só o visitante sacar sua curiosidade em direção à vigilância e desvendar a verdade: o lugar tem câmeras de pneus espalhadas nos postes.


Nos canteiros, um caminho indica que existe criação de mini-porcas. No chiqueiro, porcas de parafuso boiam nas tigelas de ração.


Em gaiolas, as crianças podem admirar um casal de pacus. Peixe voando? Não, dois rolos de papel higiênico entre as grades.

Na ala do mico, as pessoas sobem por uma longa escada destinada a ter um contato inédito com a natureza e cumprimentar o simpático animalzinho. Ao espiar dentro de um misterioso buraco no tronco, encontrarão a própria imagem refletida no espelho. Assim pagam literalmente um mico.

Toda mensagem tem duplo sentido no divertido restaurante Café Colonial, casarão às margens da rodovia Canoas-Soledade (BR-386), em Marques de Souza, cidade a 132 quilômetros de Porto Alegre.

– A alegria abre o apetite – conceitua Helena Stacke, 55 anos, uma das gerentes da casa, ao lado da cunhada Janice Ledur, 37, das irmãs Marlise, 47, e Loine, 57 e da mãe Ila, 79.

As provocações no espaço surgiram da irreverência lírica do comerciante Jorge Luís, antigo proprietário do local, que faleceu de câncer em 2009, aos 38 anos.

– Meu irmão inventou uma linguagem diferente dos sérios e tradicionais pontos de parada na estrada gaúcha. Apostou no acento infantil, na postura de amigo gozador – diz Janice, viúva de Jorge.

Jorge Luís tornou-se um Barão Itararé dos talheres. As ciladas são cartuns ao vivo, despertam associações poéticas com jogos de palavras e inversão de sentidos.

Às vezes desconcerta com o óbvio, zombando do nosso exagero supersticioso e da mania de querer controlar a vida. Uma pedra, mera pedra do Rio Forqueta, é uma estação meteorológica que nunca errou o tempo. O tabuleiro comprova o histórico de cem por cento de aproveitamento.


O público adotou o café colonial como santuário do humor gastronômico. Desde 1970, procissão de fiéis visita o endereço à procura da quebra da rotina e da leveza das charadas.

– Fazer alguém rir já é um milagre, né? – questiona a matriarca Ila.

No início, as pessoas paravam para comer e acabavam rindo das brincadeiras, depois elas vinham rir das brincadeiras e aproveitavam para comer.

– O povo triplicou de uma hora para outra – comenta Janice.

Nenhuma tragédia tira a graça das cenas. Nem o pedágio instalado um pouco antes do local, a 300 metros, que inibiu o livre vaivém dos moradores da região. Muito menos a medida do governo federal, de 2008, proibindo a venda de bebida alcoólica nas estradas, que reduziu o lucro do bar pela metade.

Jorge não chiava, perseguia uma perspectiva otimista dos revezes financeiros. Dentro do restaurante, montou uma abastada estante de garrafas, com o melhor das cachaças mineiras e dos uísques envelhecidos. No alto, escreveu:

Proibido o consumo, mas pode olhar à vontade.

– Mostramos que beber não é uma condição para ser feliz – completa Loine.

O atendimento nas mesas também segue à risca à intransigência da piada. A garçonete está treinada a não obedecer ao pedido para fechar a conta, continua renovando fartas porções de bife, fritas, salsicha Bock, salada de maionese, massa com molho, ovos, pães e cucas.

É uma cena hilária: o comensal suspira que está satisfeito, ela se faz de surda e recoloca as guarnições a cada 10 minutos. Consiste numa verdadeira saideira alimentar: uns recomeçam os trabalhos, outros são obrigados a se levantar com medo de ultrapassar os limites físicos.

– Não desejamos nos despedir do visitante, a refeição unicamente termina quando ele vai embora – explica Helena.

O cliente não tem razão no Café Colonial, o que ele precisa ter é imaginação.

Publicado no jornal Zero Hora
Ps. 20-21, 12/02/2012
Porto Alegre, Edição N° 1697
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sábado, 11 de fevereiro de 2012

ULTRACARPINEJAR


Foto de Cínthya Verri/Diagramação de Rodrigo Lima

O escritor FABRÍCIO CARPINEJAR está literalmente fazendo moda. O poeta, cronista e colunista de Zero Hora inspirou uma linha de óculos da marca Volpini, do Rio Grande do Norte – grandões, esféricos, coloridos e com um toque pop.

Há modelos com lentes azuis, verdes, vermelhas e rosas – como o que o autor está usando na foto aí do lado. O conceito carpinejariano é uma homenagem aos seus heróis da infância: Spectreman e Ultraman (foto).

O produto começa a ser comercializado em março – e as encomendas podem ser feitas pelos e-mails helbervolpini@gmail.com ou volpini@oculosvolpini.com.br. Ô, psit, caiu com a Cápsula Beta aqui: o Carpinejar parece mesmo ser da família Ultra com esses óculos, né?

Notícia publicada no jornal Zero Hora
Segundo Caderno, Coluna de Roger Lerina
11/02/2012, Contracapa, Edição N. 16976

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CALMANTE NÃO É SOLUÇÃO PARA TODAS AS HORAS

Arte de Lucien Freud

Viver é incomodar. A mosca na sopa não deixa de ser um tempero. Menos ansiolítico, mais verdade na tristeza. Confira meu comentário na manhã de sexta (10/2), no programa Gaúcha Hoje, na Rádio Gaúcha, acompanhado de Daniel Scola e Antonio Carlos Macedo:

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

SEGURAR UMA MULHER É IGUAL A BATER

Arte de Oskar Kokoschka

O homem é violento.

Se você acredita que não é perigoso, é ainda mais selvagem. Sua raiva está reprimida, prestes a desaguar por um motivo banal.

Não brigamos intencionalmente, brigamos por soberba, quando nos julgamos imunes ao pior e terminamos pegos desprevenidos pelo monstro que somos.

Todo homem requer consciência de sua agressividade para nunca desrespeitar uma mulher.

Não deve confiar nas aparências, alegar que é educado, que é sensível, que é romântico – este é o caminho mais rápido à fatalidade.

Todo homem, apesar da feição civilizada, é um pugilista manso, um lutador amarrado, um arruaceiro contido.

A violência doméstica não é exclusividade dos outros, não é possessão do demônio.

Você é violento, não se sinta mal, não está sozinho nisso, eu sou violento, talvez mais violento do que um cão com raiva, do que um tigre magro, do que um leão levemente envelhecido.

É normal a coexistência da maldade e da bondade, do claro e do escuro, do divino e do bestial num só gesto.

Poeta, engenheiro, arquiteto, violinista, florista, não há profissão que nos salve do grito, dos punhos fechados e da ânsia de eliminar a resistência na base da força.

A questão é não permitir a ebulição da ira. Fugir das situações de descontrole, do deboche e da penúria do humor.

Evite se expor às ofensas por mais de duas horas – há uma cota de desaforo suportável pelo sangue.

O homem é Etna, é Fuji, é Vesúvio, um vulcão adormecido que pede vigilância perpétua.

Não batemos porque somos provocados. Batemos porque desejamos acabar com a crise de qualquer jeito. Batemos porque não nos conhecemos, e sempre deduzimos que uma agressão na adolescência representou uma exceção, que uma vez trocamos sopapos no trânsito para nos defender. Deliramos que o ato de jogar a cadeira na parede apenas traduziu um momento.

Nenhuma justificativa pode disfarçar o problema de fundo: somos naturalmente violentos. Ouça-me enquanto é cedo e não ameaça sua companhia.

Nenhuma explicação abafa o ódio. Reconstituição somente existe depois da morte, o inferno e o Presídio de Charqueadas estão lotados de desculpas.

Tatue a Maria da Penha nas pálpebras, tome as providências para não se achar imutável e maior do que a realidade.

Esmurrar a porta já é invasão. Arranhar a mulher já é soco. Empurrar a mulher já é espancamento. Não invente atenuantes.

E, por favor, não segure sua mulher, mesmo que seja para acalmá-la, mesmo que seja para contê-la, mesmo que seja para abraçá-la e dizer que a ama. Segurar num momento de tensão é igual a bater. Agredir sempre foi simples demais. A ternura que é trabalhosa, a ternura que não é de graça, a ternura que leva tempo.

Cuide de si para cuidar de sua esposa.



Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 7/02/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 16972

HÁ GENTE QUE NÃO ESPERA O PIOR, PLANEJA O PIOR

Arte de R. B. Kitaj

Os maiores desencontros acontecem pela ansiedade, não porque o casal não queria se encontrar, mas justo porque desejava se encontrar tanto.
Na minha primeira saída com a Cínthya, minha mulher, eu marquei no Cine Guion, às 19h. Cheguei 18h30. Mas fiquei tão ansioso que apareci cedo demais e fui dar uma volta para não entregar que estava a fim dela. Retornei 19h15. Mas a Cínthya surgiu 19h pontualmente, acreditou que não iria e foi dar uma volta. E não nos achamos naquela noite.
Ambos pensaram que um deu o fora no outro. E poderíamos ter ferrado a relação se não houvesse insistência.
A ansiedade faz com a gente se sinta desamado. Abandonado. É uma ilusão negativa.
A ansiedade é o início da paranóia. É um Juízo Final.
A ansiedade torce pelo pior para não ter que sofrer depois.
É o mesmo desencontro com o telefone. Quando a ligação cai, temos que esperar que aquele que ligou ligue de novo. Mas o que ocorre?
Eu ligo, ela liga, os dois se ligam ao mesmo tempo. E os dois telefones ficam ocupados. E nenhum dos dois consegue restabelecer a linha.
E aí entra o medo: ela não quer mais me atender? Eu falei algo de errado? Ela desligou o telefone na minha cara?
Não conheço ansiedade otimista, que pense coisas boas, que não antecipe decepções. Ansiedade é o medo de ser rejeitado. Ansiedade só antecipa tragédias no amor.
A ansiedade não ajuda a comunicação. Respire fundo e aguarde no lugar que você marcou na hora que você marcou.

Ouça meu comentário na Rádio Gaúcha na manhã de terça (7/2), programa Gaúcha Hoje, com Antonio Carlos Macedo e Daniel Scola:

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

TRÁFICO VERBAL

Arte de Yves Tanguy

Quais as expressões mais irritantes que escutamos dos outros? E que podem traficar uma ofensa.

1) "Você está melhor do que antes"
Não significa que gostou. É uma frase malandra. O que eu posso entender? Antes a pessoa estava horrível, agora está apenas ruim.

2) "Você é meu braço direito"
Tomaria cuidado com esse falso elogio. Ainda mais se quem diz é canhoto.

3) "Veja bem"
É arrogante, uma aula forçada. Veja bem é o equivalente a dizer: Seu idiota, você nunca aprende nada.

4) "Eu iria fazer uma surpresa"
E por que não fez? É um atestado de preguiça, de falta de vontade, não quis ter trabalho e manter o suspense.

5) "Ok"
Ok é uma palavra fria no amor, que traduz desapontamento. Funciona apenas no trabalho. Fora dele, é algo como "Cala a boca, não desejo mais falar do assunto".

6) "Você parece mais jovem"
Sim, é uma forma de avisar que a pessoa já é velha, por mais que se esconda na aparência.

7) "Meio-irmão"
Existe meio-pai, meia-mãe? Irmão é ou não é. Triste reduzir pela metade aquele que vive conosco.

8) "Me dá um beijo"
Beijo é interpretação de um momento. Não pode ser feito por liminar, ordem, licença. Beijo não se dá, se rouba. O melhor beijo é o roubado. Tanto que o casamento é a condenação perpétua pelos beijos roubados.

Acompanhe meu comentário na Rádio Gaúcha de sexta (3/2), no Programa Gaúcha Hoje:

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

A AMÉRICA É UMA GANGORRA


O Grêmio parou de ganhar Libertadores, o colorado passou a devorar títulos internacionais.

Rolo Compressor tem a resposta para mudança da dupla Gre-Nal.

"Desde Hugo de Léon, barbudo inacreditável, zagueiro no melhor estilo anjo exterminador, o Grêmio fracassou em integrar argentinos e uruguaios em seu time.
Há quase trinta anos, tenta transfusão e não obtém tipo sanguíneo compatível. Experimentou Loco Abreu (URU), Saja (ARG), Schiavi (ARG), Herrera (URU), Máxi Lopes (ARG), Escudero (ARG), Miralles (ARG), nenhum desponta, mostra personalidade, obtém desempenho persuassivo.
A lacuna explica a ausência de títulos continentais pelo tricolor."

Faca na bota!, leia aqui.

PINHAL


Sou patrono da XIV Feira do Livro do Balneário Pinhal, que acontece de 2 a 5 de fevereiro, no Parque Cidadão (Em frente a Prefeitura). Na quinta (2/2) , às 21h, faço a palestra "Amor sem igual, todo abraço é uma escrita". Entrada franca.